Grafite não pode mais ser considerado crime

Agora é lei: grafite não pode ser considerado crime
O grafite não pode mais ser considerado crime. Tem muita gente que não sabe, mas, até o semestre passado, a prática era considerada ilegal e quem fosse abordado poderia responder por depredação patrimonial. Agora, uma emenda ao projeto de Lei Federal n°176, já publicada no Diário Oficial da União, garante a descriminalizarão do grafite desde que a prática tenha o objetivo de valorizar o patrimônio público e privado, mediante manifestação artística, com consentimento dos proprietários dos imóveis utilizados como base para ação. A nova redação diferencia o grafite da pichação que continua sendo considerada ilegal. A discussão traz a tona diversas controvérsias, dentre elas o debate em torno de qual seria o valor do grafite, do que ele representa e de sua importância histórica.

Para o professor da faculdade de educação da UFMG, Juarez Dayrell, no início, o grafite ocupava um lugar totalmente marginal, sendo até mesmo alvo de repressão, mas ao longo dos anos foi conquistando seu espaço. Para ele “o grafite era uma linguagem cultural muito fechada em determinados seguimentos sociais: o jovem, pobre, negro. Hoje, há uma abertura muito maior, uma troca inter-classe”. Dayrell também acredita que o grafite continua tendo uma base de tradição negra, mas que, no entanto, vai se transformando e se modificando, através de trocas, numa articulação entre o local e o global.

Apropriação dos espaços públicos

Ainda segundo o professor, ao apropriar-se do espaço público, a periferia passa a ser representada, a se mostrar no centro, tomando uma dimensão de protesto e também de crônica. Para ele, a principal característica do grafite é que o sujeito que produz a arte, na maioria das vezes, possuí uma forte ligação com a cultura local, mas nem por isso o trabalho final deixa de ser global. O grafite articula lazer, protesto e também é uma forma de sobrevivência.

Identidade

Para Dayrell compreender o grafite é também tentar compreender a questão da identidade do sujeito que executa. Ao definir identidade como algo semelhante a um processo, pois se constrói na relação com o outro, Juarez acredita que o grafite, como uma linguagem do Hip Hop, se coloca como um estilo de vida.

Partindo da idéia de que o individuo se constrói principalmente através de suas experiências sociais, a ação do grafiteiro se coloca nas roupas, no cabelo, nos adereços, criando uma identidade comum. Cria-se assim, segundo ele, um determinado estilo de vida que vai constituindo uma identidade, tanto individual quanto coletiva.

Dayrell afirma que apesar do movimento do grafite ser globalizado, ele é sempre ressignificado a partir de uma identidade local. “A dimensão simbólica torna-se o elemento principal de construção de uma identidade positiva criando uma postura ativa de produção cultural, o que pode refletir também na produtividade que isso gera na trajetória desses jovens”, afirma Juarez. Para o professor, com isso, esses jovens saem da posição de consumidores culturais e passam a ser produtores. “Um exercício que tende a humanizar, pois amplia a rede de sociabilidade a partir da construção de uma identidade comum”, afirma Juarez.

Arte

Para alguns especialistas em arte, como a professora da Escola Guignard, Júlia Portes, o grafite representa uma parte da cultura brasileira, que ao resgatar a memória, a tradição, deve ser considerada um exemplo de arte contemporânea. Para a professora, a obra de arte contemporânea tem que produzir questionamentos que nos levem a pensar o mundo que vivemos. Nesse sentido, o grafite, manifestação artística essencialmente urbana, se caracteriza por ser um trabalho provocador, questionador, que de certa forma se projeta no futuro ao tentar compreender o presente.

Já Juarez Dayrell acredita que artista não é aquele que domina as artes hegemônicas, mas sim aquele que utiliza a criatividade como fruto da fantasia, articula o conhecimento da técnica possibilitando a criação. Para ele, ainda mais importante do que rotular em qual categoria o grafite se encaixa é perceber que sua propagação gera um acesso à liberdade de criação, trazendo questionamentos sobre políticas públicas voltadas para a cultura e democratização da mesma.

via: http://www.favelaeissoai.com.br/noticias.php?cod=102